segunda-feira, 4 de outubro de 2010

A depressão que a crise deixa a descoberto

Quem não sofreu uma depressão clínica não consegue imaginar o que é, de facto, esta doença, mas se fizer um esforço de empatia compreende, pelo menos, como são deslocados e ingénuos os sermões com que os incitamos a sair da apatia, como se fosse uma questão de força de vontade, como se lhes bastasse querer voltar à vida, para o conseguirem.

Provavelmente, para quem mergulha neste pesadelo, só a medicação, acompanhada de uma boa psicoterapia, pode funcionar como luz ao fundo do túnel. Mas para ter acesso a uma e a outra é preciso vencer o estigma em torno da doença, que leva a procurar um médico, que seja fácil e rápido marcar uma consulta, e que SNS e seguradoras compreendam que uma terapia leva tempo, mas é mais eficaz e duradoura do que um simples engolir de comprimidos.
Contudo, reconhecer que há depressões clínicas, não significa embarcar na ideia de que vamos todos ficar clinicamente deprimidos em consequência da crise económica. Como se a angústia que a instabilidade provoca em nós, o murro no estômago que é perder o emprego, o desequilíbrio que implica a mudança de um modelo de vida que nos era familiar, sejam estados patológicos, que é preciso afogar em químicos, para apagar rapidamente os sintomas, esquecendo-se que ficam lá as causas, prontas a eclodir mal se interrompa a medicação (ou haja uma nova crise!).

Transformar a nossa vida mental, de que o sofrimento é um sinal visível, em doença é provavelmente a maior patologia deste século. Como é doentia a ideia de que podemos ser felizes todos os dias, que o luto se faz em meses, que não há momentos de balanço em que percebemos que os anos passaram sem que realizássemos os nossos sonhos, de que temos andado a dormir em serviço.

Mas o facto de não ser doença, não significa que não precise de tratamento. Precisa de uma colher cheia de coragem para descobrirmos o que nos dói e porque nos dói, para percebermos o mal estar que a crise se limitou a deixar a descoberto, e para arriscarmos novos caminhos, sem medo de pedirmos ajuda, sempre que precisarmos dela.

Por Isabel Stilwell
Fonte:  Destak.pt

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